01/11/2024 - 11:40
Ao trabalhar durante anos para grandes empresas, negociando a venda de produtos a clientes internacionais, Janaina Azevedo conquistou não apenas experiência, mas também uma compreensão bastante clara do funcionamento do ambiente corporativo – e de seus problemas. Desde 2015, ela está à frente da JA Consultoria, que oferece às empresas soluções de gestão de pessoas voltadas à obtenção de resultados nos negócios que se diferenciam por colocarem o elemento humano em primeiro plano.
Janaina conta que sua entrada no mundo do comércio exterior se deu por acaso. “Comecei a trabalhar cedo, com 15 anos. Já estudava inglês desde os nove anos de idade, então àquela altura eu já falava de forma fluente. E então veio a grande oportunidade de atuar como auxiliar em uma trading company. Foi quando eu realmente passei a conhecer a parte operacional do mercado internacional”, conta. A partir daí, ela passou a trabalhar com o setor exportador agropecuário, na parte de cargas frigorificadas. “Eu trabalhava no chão de fábrica mesmo. Nessa época viajei muito pelo Mato Grosso, conheci todas as etapas de abate, desossa, evisceração, até chegar ao produto final.” Esse conhecimento das peculiaridades das diversas fases do processo credenciou Janaina a atuar na área comercial da empresa. “A experiência de entender a área operacional de perto foi essencial em me dar uma capacidade maior de negociar quando fui para o setor comercial”, complementa.
Nesse período, há quase três décadas, o agronegócio brasileiro estava iniciando o processo de internacionalização que hoje o coloca como responsável por cerca de metade das vendas externas do país. E foi justamente nessa época de consolidação e expansão do setor que Janaina foi adquirindo experiência e conhecimentos – negociando com clientes, conhecendo as especificidades dos diferentes mercados compradores e enfrentando o desafio de atuar em um setor que até hoje é dominado pela presença masculina. “Imagine minha situação, como uma jovem que ainda estava aprendendo. Encontrei muitos desafios, mas também muitas oportunidades”, salienta.
Diferenças culturais
A essa altura, Janaina já negociava com clientes de diversas partes do mundo, aumentando sua experiência e se tornando conhecida no mercado. Contudo, foi ao atuar em outra empresa, que comercializava produtos lácteos para clientes no exterior, que ela experimentou em primeira mão o desafio que a diferença cultural pode trazer à área de negócios internacionais – em um episódio que simboliza sua vontade de superar obstáculos. “Eu trabalhava para uma grande exportadora de leite em pó, e negociei durante meses com um cliente da Arábia Saudita uma grande venda. O negócio seria finalizado em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, durante a realização da feira de alimentos Gulfood – foi a primeira vez que viajei para o Oriente Médio”, conta.
Só que, ao chegar e se encontrar pela primeira vez presencialmente com seu cliente, este levou um susto: ao longo de todos os meses de negociação, ele acreditava que “Azevedo” fosse um homem. Quando descobriu que se tratava de uma mulher, ele se negou, por uma questão cultural, a sequer conversar com ela sobre negócios. “Naquela época não havia WhatsApp, a conversa era mesmo por e-mail. Ele me chamava de ‘Mr. Azevedo’ – e eu não o corrigi. No dia da viagem, meu gestor me avisou sobre a cultura muito diferente do Oriente Médio, e que o cliente poderia não falar comigo por ser mulher. Mas mesmo assim aceitei o desafio, e quando houve a reunião e o cliente perguntou quem era o ‘Mr. Azevedo’, eu respondi que era eu. A partir daí, ele só conversava com meu gestor – nem sequer olhava para mim. Chegou uma hora que eu não aguentei e perguntei porque ele não se dirigia a mim. Por meio do tradutor, ele disse que ele não estava acostumado a negociar com mulheres – e nem as vira antes em posição de tomar decisões de negócios. Foi um baque!”, relembra.
Mas esse revés estimulou Janaina a buscar outra estratégia para “dobrar” seu cliente. Tomou uma gravata emprestada de seu gestor, amarrou o cabelo em um coque e foi à reunião do dia seguinte, na qual seria decidido o negócio, trajada de forma masculina. “Meu gestor disse para pensar bem no que estava fazendo, e que, se o cliente não assinasse o contrato por causa disso, eu perderia o emprego. Eu aceitei o risco e ainda propus que, se conseguisse o contrato, teria 30% de aumento no meu salário, mais mercados para atuar e participação variável nos lucros. Ele aceitou.”
Iniciada a reunião, o cliente continuou falando diretamente apenas com o gestor de Janaina. Mas já olhava para ela, e parecia estar mais à vontade – contrastando com a tensão que projetava no dia anterior. E o negócio foi fechado. “Na despedida, ele pediu para o tradutor perguntar se era costume no Brasil as mulheres se vestirem daquela forma. E eu respondi que me vesti daquela forma em razão do desconforto que ele havia sentido no dia anterior, e para que pudéssemos concluir a negociação. Ele deu um sorriso, e disse que as mulheres brasileiras eram mais arrojadas”, afirma.
Assim, Janaina conseguiu não apenas fechar o contrato e obter as condições acertadas com seu gestor, mas passou a ser reconhecida como uma mulher que conseguia negociar com sucesso junto a clientes do Oriente Médio. Esse reconhecimento valeu um convite da Câmara de Comércio de Comércio Árabe-Brasileira (CCAB) para que ela ministrasse a palestra Como Negociar com o Mercado Árabe.
Gestão humanizada
A partir daí, Janaina passou por diversos desafios profissionais – atuando com clientes no Oriente Médio, na China e na Holanda, por exemplo. Há cerca de 15 anos começou a atuar na área de comércio exterior do setor farmacêutico, onde continua até hoje. “Trabalho na área de insumos, pesquisa e desenvolvimento – o que se destacou bastante na época do surgimento da pandemia da Covid-19, quando havia a necessidade de se criar uma vacina”, afirma. Ela diz que essa trajetória permitiu a ela aprender cada vez mais, nunca ficando em uma zona de conforto. “Com o tempo também ganhei mais maturidade, e olho as atitudes que tomei há dez, doze anos atrás, que poderiam ter sido mais pensadas. Hoje sou mais cautelosa – embora ainda faça valer o que penso.”
Esta reflexão fez Janaina considerar o aspecto humano do mundo corporativo como sendo o mais importante; afinal, ela havia atuado em empresas nos quais a ênfase nos resultados acabava por criar, muitas vezes, ambientes tóxicos. “Por ter desenvolvido minha carreira nesse ambiente, acabei incorporando algo dele também. Até que comecei a pensar melhor nisso e vi a necessidade de mudar. Fiz terapia, mas também passei a me especializar nesse aspecto mais humano. Cheguei a tirar licença nos EUA em programação neurolinguística”, conta.,
Essa busca por um modelo de liderança mais humanizado, que engaje as pessoas de forma genuína, a levou a criar, em 2015, uma consultoria na qual poderia aplicar suas ideias. Estabelecida para atender pessoas e empresas por meio de mentorias individuais ou em grupo, da organização do planejamento estratégico e do desenvolvimento das potencialidades dos colaboradores, a JA Consultoria contribui para acelerar carreiras individuais ou otimizar negócios.
“Trata-se de uma consultoria de negócios, criada com o intuito de gerir pessoas. Eu ofereço treinamento de vendas, mentorias, e formas de as empresas obterem resultados por meio da gestão humanizada de seus colaboradores. Hoje tenho parceiros que trabalham comigo”, afirma, acrescentando ser bastante recompensador ver as mudanças que sua abordagem vem gerando nas empresas. “Conto ainda com uma equipe bem robusta; a gente conversa sobre tudo, dentro de um modelo de gestão muito participativo.”
Janaina está confiante no crescimento da JA Consultoria – e já trabalha na ampliação dos treinamentos e mentorias que são atualmente oferecidos. “No momento estamos desenvolvendo algo que tem sido muito demandado: treinamentos exclusivos para mulheres. Porque ainda não estamos livres de ambientes tóxicos no meio corporativo, e temos de nos posicionar de forma muito firme – sem perder a compostura ou a inteligência emocional”, finaliza.
Em entrevista ao IstoÉ Sua História, Janaina Azevedo fala sobre sua trajetória, os desafios encontrados no caminho e sua missão de tornar a gestão de pessoas nas empresas mais humanizada. Confira o papo na íntegra:
Conteúdo produzido exclusivamente para a seção Sua História, como branded content. Todas as informações foram fornecidas pelo entrevistado e não refletem a opinião de IstoÉ Publicações.