Dentre as diversas especialidades no campo da medicina, a área de neurocirurgia é considerada uma das mais desafiadoras, por exigir de seus praticantes um alto nível de habilidade técnica e conhecimentos aprofundados, que exigem constante atualização. Mesmo assim, este foi o caminho escolhido por Valério Marcelino Braga, um menino vindo de uma família humilde da cidade de Barra Mansa, no Rio de Janeiro. O sonho tornou-se realidade, com uma carreira de mais de duas décadas, e que recentemente foi resumida em um livro – e que em breve deverá ser filmada como uma minissérie.

De acordo com Braga, tudo começou na infância. Com três anos de idade, Braga já fazia desenhos em que copiava imagens de anatomia da Nova Biblioteca Médica do Lar, um livro de referência que sua família tinha em casa. Esse interesse levou sua mãe a lhe dar de presente uma maletinha médica de brinquedo, que continha réplicas de equipamentos variados, como estetoscópio, otoscópio (instrumento usado principalmente para examinar o ouvido, garganta ou nariz), óculos e uma seringa para injeção, além de uma etiqueta para se colocar o nome do doutor. “Quem escreveu foi minha mãe, já que eu nem alfabetizado era ainda. Essa maleta ainda existe, quase cinquenta anos depois”, conta.

Ao mesmo tempo em que acalentava a ambição de seguir carreira na medicina, Braga também trabalhava. “Eu sempre estudei em escola pública, e ajudava minha mãe vendendo cocadas para os vizinhos e entregando as peças de crochê que ela produzia. Aos 14 anos comecei a trabalhar em uma banca de jornais; foram sete anos de aprendizado no trato direto com as pessoas, levantando de madrugada”, afirma. 

A essa altura, o sonho em se tornar médico já ia tomando forma – sempre com o apoio da família. “Meu pai era porteiro de prédio – mas nem ele nem minha mãe desacreditaram do meu sonho. Eu tinha vontade de estudar em uma escola particular da vizinhança, e perguntava se isso era possível. Um dia minha mãe disse que não tínhamos condições financeiras para isso – mas que eu era inteligente, e em qualquer escola que eu estudasse, eu iria conseguir o que eu queria. Esse incentivo foi muito importante”, afirma, acrescentando que outra pessoa importante nessa fase de formação foi seu tio, Paulo Pedro Marcelino, que estimulava sua curiosidade com livros, “principalmente após a morte do meu pai em 1993, quando sofreu um infarto agudo, ainda dentro de nossa banca de jornais.”

Trajetória ascendente

Essa dedicação aos estudos levou Braga a fazer o vestibular de medicina da Universidade Iguaçu (Unig), em Nova Iguaçu, no final de 1993 – e ser aprovado. Mas só conseguiu seguir adiante devido ao seguro de vida de seu pai e, posteriormente, por meio do crédito educativo. Com dedicação redobrada, aplicou-se aos estudos, no ano seguinte transferiu-se para o Centro Universitário de Volta Redonda (UniFOA), e em 1997 já fazia estágio como acadêmico de medicina na Casa de Saúde Santa Maria, em Barra Mansa, trabalhando junto com um de seus professores de Cirurgia Geral, Tito Guimarães, e também com Ivan Bueno – que, por coincidência, foi o profissional responsável por apresentá-lo à mãe ao nascer, naquele mesmo hospital. Em 1999, mesmo ano em que se forma, Braga perde seu tio. “Ele era um guru para mim, a pessoa que era, para mim, um exemplo de vida. Muito do que me tornei devo a ele – que faleceu e não conseguiu ver minha formatura”, lembra.

A partir daí, Braga iniciou carreira profissional na Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, e em 2001 ingressou em caráter definitivo no serviço de neurocirurgia da instituição, que era liderado então por Paulo Niemeyer Filho. Ele foi diversificando sua atuação, dando plantão de clínica médica em Barra Mansa, e também atuando como neurocirurgião no hospital São João Batista em Volta Redonda, além dos plantões no Rio de Janeiro, nos hospitais Getúlio Vargas e Salgado Filho. Em meio a essa trajetória, Braga foi acumulando especializações na área – dedicação que lhe valeu, em 2004, o título de Especialista em Neurocirurgia concedido pela Sociedade Brasileira de Neurocirurgia (SBN). Este era o momento de voltar a Barra Mansa, onde passou em 2005 a atuar na Casa de Saúde Santa Maria: local de seu nascimento, instituição na qual começou a aprender a arte médica, e onde continua exercendo suas atividades como neurocirurgião. 

Um dos episódios lembrados dessa fase inicial foi fazer parte da equipe médica que tratou do músico Herbert Vianna, da banda Paralamas do Sucesso, quando ele se acidentou em um voo de ultraleve em Mangaratiba (RJ), em fevereiro de 2001. Na época Braga estava no segundo ano de residência. “A gente não imaginava que ele iria se recuperar. Primeiro ele recebeu tratamento neurocirúrgico na coluna vertebral, para estabilização de uma fratura que o deixou paraplégico. Depois passou por tratamento neurocirúrgico, para drenagem de um hematoma cerebral. Mas no final ele se recuperou a ponto de voltar aos palcos”, afirma, acrescentando que a ele coube a responsabilidade de manter o serviço de neurocirurgia da Santa Casa do Rio de Janeiro em ordem, junto a outros residentes, enquanto o caso de Vianna era tratado por Paulo Niemeyer Filho e seus assistentes diretos.                        

Em sua trajetória, Braga tratou de casos desafiadores – alguns até bastante insólitos. “Eu estava para operar um homem com tumor cerebral quando descobri, na mesma semana, após o atendimento de uma paciente no consultório, que haveria de solicitar uma cirurgia com certa urgência. Identifiquei em uma ressonância de coluna cervical uma compressão medular importante, mas logo depois descobri que a paciente era esposa do homem com tumor cerebral, e o casal tinha dois filhos. Naquele momento senti a pressão de ser um neurocirurgião; qualquer descuido poderia destruir uma família inteira”, conta. No entanto, tudo deu certo: as duas operações foram bem-sucedidas. “Até hoje os dois se consultam comigo e chegam de mãos dadas. Ver isso, para mim, não tem preço.” 

Incentivo às novas gerações

Durante a pandemia da Covid-19, Braga resolveu expor sua trajetória em um livro. Sua finalidade era mostrar para outros jovens, estudantes de escolas públicas, que era possível atingir seus sonhos com determinação e empenho. “Sempre que eu chegava no trabalho, eu necessariamente passava em frente à escola que eu estudei a minha vida inteira. Às vezes eu via as crianças subindo ali e eu ficava pensando: o que eu poderia fazer para mudar um pouco aquela situação? Porque eu não me lembrava de outro médico que tinha saído daquela escola pública, onde eu estudei. Eu sabia o quanto era difícil, mas eu precisava jogar uma semente. Então, eu tive a ideia de contar a história toda, como foi desde o começo, e colocar tudo em um livro, para mostrar que era possível chegar lá. Entrei em contato com a Secretaria Municipal de Educação de Barra Mansa, que logo aprovou o projeto, e distribuímos 3 mil exemplares do livro na rede pública de ensino do município. Foi uma experiência maravilhosa ir falar para os alunos sobre o livro; eu via os olhos deles brilharem.” 

O sucesso da iniciativa levou Braga a contratar uma editora para publicar a obra comercialmente. O resultado é o livro Perseverança: A Escalada de um Jornaleiro até a Neurocirurgia, da editora portuguesa Novos Ases, lançado em julho de 2023 e disponível em plataformas de e-commerce. No final do ano, o livro foi o vencedor do prêmio Clarice Lispector, na categoria de melhor livro biográfico de 2023. 

Agora, Braga se prepara para levar sua trajetória às telas. No final de 2023 ele recebeu contato de uma produtora de audiovisual do Rio de Janeiro, a Pajé Cultural, que interessada em desenvolver a história do livro em uma minissérie de cinco capítulos, com o título Perseverança: Não Existem Coincidências. “Estabelecemos uma parceria com a Pajé Cultural, na qual seu diretor Fernando Mamari segue diretamente com o projeto, que já se encontra em fase de roteirização e pesquisa de elenco. Em breve será iniciada a fase de captação de recursos”, afirma. “Desta forma, estamos abertos a empresas que queiram participar com a lei de incentivo à cultura, que tanto traz benefício à empresa doadora quanto nos impulsiona para esta nova fase, permitindo transpor essa história das páginas de um livro para as telas.” Interessados em participar podem entrar em contato por meio dos endereços de e-mail bragavalerio13@gmail.com e fernandomamari@pajecultural.com, e pelas páginas do Instagram @dr_valeriobraga, @livroperseveranca e @pajecultural.

Em entrevista ao IstoÉ – Sua História, Valério Marcelino Braga compartilha sua trajetória. Confira o papo na íntegra:

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